O tédio como presença
Walter Benjamin descreve o tédio como «o pássaro de sonho que choca os ovos da experiência».
Naturalmente, não se trata apenas de uma imagem poética – belíssima, por sinal! –, mas também de uma inversão do sentido da palavra «tédio», que, pelo visto, sempre foi o mesmo.
Para nós, tédio é sinônimo de desgosto, cansaço, falta de interesse. A pessoa entediada sente o tempo passar mais lentamente do que o normal. É quase como se ela estivesse suspensa no vácuo, à deriva no espaço, sem esperança de resgate.
Na descrição de Benjamin, porém, o enfado não aparece como ausência de algo que deveria estar ali, mas como presença total – um estado de vigilância constante sem o qual a experiência deixa de ser vivida e se torna mero passatempo.
Em termos menos abstratos, podemos dizer que o tédio é uma espécie de moldura a ser preenchida pelo quadro de nossas vivências pessoais. Esse quadro vai sendo pintado aos poucos, desde o berço até o túmulo.
O drama surge quando você olha para a tela e vê que a pintura está ficando horrível, e até medonha. Você se sente tão perplexo quanto Dorian Gray mirando o seu pavoroso retrato.
Mas chega de metáforas. O que eu quero dizer é que muita gente confunde experiência com distração, sobretudo no mundo de hoje, onde as pessoas consomem informações como quem fuma um cigarro atrás do outro, e ainda sentem vergonha de estar mal-informadas. Em outras palavras, nos tornamos caçadores de informação.
Eu poderia culpar o avanço da tecnologia, o advento do smartphone e da Inteligência Artificial pelo consumo desenfreado de notícias, e também pelo fato de as pessoas buscarem sufocar o tédio, ocupando seu tempo livre com qualquer besteira. Mas isso tudo é apenas o sintoma de uma doença mais antiga do que a imprensa de Gutenberg.
Proponho, quem sabe, uma reflexão aos predadores embrenhados na floresta digital: e se vocês pararem de caçar o pobre pássaro de sonho? Permitam que essa ave misteriosa descanse no galho de uma das árvores, que faça ali o seu ninho, que bote os ovos da experiência e vejam o que acontece.



Belo texto, Gustavo! Belo e verdadeido!
Belíssima reflexão!!